Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito
Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito
Criminologia Dialética, 50 Anos: Um Diálogo com o Legado de Roberto Lyra Filho. Autores Co-organizadores: José Geraldo de Sousa Júnior, José Carlos Moreira da Silva Filho e Salo de Carvalho. Autores: Carvalho, Salo de , Sousa Junior, José Geraldo de , Costa, Alexandre Bernardino , Cerqueira Filho, Gisálio , Castilho, Ela Wiecko Volkmer de , Lemos, Eduardo Xavier , Dornelles, João Ricardo W. , Rubio, David Sánchez , Pandolfo, Alexandre Costi , Adeodato, João Maurício , Silva Filho, José Carlos Morei , Ferreira, André da Rocha , Anitua, Gabriel Ignacio , Neder, Gizlene , Coelho, Inocêncio Mártires , Santos, Juarez Cirino dos , Oliveira, Lair Gomes de , Santos, Lorena Silva , Souza, Marcel Soares de , Dinis, Marcia , Noleto, Mauro Almeida , Souza Júnior, Ney Fayet de , Andrade, Vera Regina Pereira de , Capeller, Wanda. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2022, 548 páginas.
Na Descrição apropriada pela Editora para a sua página, extraída de meu texto prefacial, está:
(…) a título de explicação pessoal, abrindo a edição de 1972, da Borsoi, da Criminologia Dialética, Lyra Filho indica que seu o livro assinala um movimento de reconstrução intelectual, cuja autenticidade parece evidente. Certamente não se continha numa autorreflexidade como balanço de percurso, mas como esboço de um programa de uma virada político-epistemológica que assinalasse uma convocatória para um trânsito paradigmático; na política, com a intensificação de um paroxismo autoritário e que o campo penal para o controle seletivo de condutas, notadamente em relação às subjetividades ativas que resistiam à exceção, abriam mobilizações para o protesto social. O ano é 1972. Tempo cruento. No plano epistemológico, a abertura de uma passagem da dogmática penal positivista pela interpelação do social em movimento, sugerindo leituras que se inspirassem em esforços de sociologização do delito.
Diz Roberto Lyra Filho na explicação pessoal, justificando: primeiro, porque ela ressalta (o movimento de reconstrução intelectual), do esforço para vencer preconceitos e reorientar o produto de longo estudo e reflexão. O ponto de partida é a criminologia crítica; a sugestão apresentada é a criminologia dialética, em que ela se consuma. Segundo, porque esta disposição positiva exige, apesar de tudo, certa coragem, a uma altura da vida em que se costuma deixar morrer a inquietação. O risco, então, é aceitar aquela maturidade prudente e só atenta ao cultivo do prestígio acadêmico.
Com a publicação, tem início todo um programa de lançamentos que transforma a edição num projeto de ano jubileu para marcar a contribuição de um dos mais instigantes pensadores brasileiros.
Já agora em agosto, no dia 29, das 10 às 12 horas, no espaço da Semana Universitária da Universidade de Brasília, teremos um evento com o título: 50 Anos da “Criminologia Dialética”: homenagem do Grupo Candango de Criminologia ao Prof. Roberto Lyra Filho
Trata-se de uma atividade em formato de Seminário de integrantes do Grupo Candango de Criminologia (GCCRIM) sobre a obra “Criminologia Dialética”. Organizado sob a responsabilidade da professora Ela Wieko Volkmer de Castilho, também autora na obra, para realizar os objetivos de comemorar o cinquentenário da obra “Criminologia Dialética”, um dos marcos da criminologia crítica brasileira; de expor as premissas epistemológicas e os conceitos fundamentais desenvolvidos por Lyra Filho em “Criminologia Dialética” e de tornar mais conhecido o pensamento criminológico de Lyra Filho entre estudantes de Direito.
No mesmo dia, ao final de Seminário será feito um primeiro lançamento do livro.
Em setembro, no dia 14/9, o programa do 13o Congresso de Ciências Criminais que acontecerá na PUCRS, aceitou incluir também um lançamento do livro.
Logo depois, em 13 de outubro, data em que Roberto Lyra Filho completaria 96 anos, o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), fundado em 1843, também fará um lançamento da obra. O evento está sendo preparado pelo Presidenta da Comissão de Criminologia do IAB Márcia Dinis, também autora na obra. Márcia está preparando um ciclo de estudos em homenagem a Roberto Lyra Filho, que integrou os quadros do IAB, previsto para realizar-se em novembro deste ano. Aliás, integram a Comissão de Criminologia vários membros autores no livro.
Com efeito, é de se esperar que com tantos autores e autoras e o rico painel que forma o livro, é legítimo esperar que o ano jubileu favoreça um auditório ampliado para a atualização e a emergência de novos temas que possam robustecer o campo dos estudos criminológicos.
Basta percorrer esse conteúdo traduzido no Sumário do livro. Ele abre com uma Apresentação a cargo de José Carlos Moreira da Silva Filho e Salo de Carvalho, seguindo-se meu texto, Criminologia Dialética de Roberto Lyra Filho, 50 Anos: um Manifesto Crítico à Crítica Criminológica (um Prefácio).
Logo, o conjunto de textos que compõem a Obra e seus respectivos autores e autoras:
A Criminologia Crítica em Articulação com a Epistemologia Decolonial, de Alexandre Bernardino Costa | Lorena Silva Santos
Estado e Estudo: Considerações Dialéticas, Alexandre Costi Pandolfo
Roberto Lyra Filho: Dialéctica Humanista, Pluralismo Jurídico y Procesos de Lucha por la Libertad y la Dignidad, de David Sánchez Rubio
A Criminologia Dialética e o Humanismo Dialético: o Projeto de uma Legítima Organização Social da Liberdade de Roberto Lyra Filho, de Eduardo Xavier Lemos
A Teoria Emerge do Contato com a Práxis, de Ela Wiecko Volkmer de Castilho
Roberto Lyra Filho y los Antecedentes de una Criminología Crítica Latinoamericana: Dialéctica, Integralidad y Pluridisciplinariedad en los Comienzos de los Años Setenta, de Gabriel Ignacio Anitua
A Lyra de um Hegeliano, de Gizlene Neder | Gisálio Cerqueira Filho
Roberto Lyra Filho e Miguel Reale: Duas Visões da Dialética Jurídica, de Inocêncio Mártires Coelho
O Sistema Jurídico dos Estados Unidos da América Hoje (no exemplo do Estado da Geórgia), de João Maurício Adeodato
A Criminologia Dialética de Roberto Lyra Filho e a Atualidade da Criminologia Crítica, de João Ricardo Dornelles
Criminologia Dialética, Danos Sociais e Crimes dos Poderosos – Um Diálogo a Partir dos Questionamentos Essenciais de Roberto Lyra Filho no Âmbito Criminológico, de José Carlos Moreira da Silva Filho
Foucault: Poder, Biopolítica e Guerra, de Juarez Cirino dos Santos
Apontamentos para uma Contextualização Urbana da Criminologia Dialética de Roberto Lyra Filho, de Lair Gomes de Oliveira
Em Defesa da Despenalização: uma Análise do Projeto de Lei nº 4540/2021 a Partir de Roberto Lyra Filho, de Marcia Dinis
O Problema da Subjetividade Jurídica no Direito que se Ensina Errado, de Mauro Almeida Noleto
O Direito Penal Achado na Aldeia: a Possibilidade de uma Autonomia Penal Indígena a Partir da Criminologia Dialética de Roberto Lyra Filho, de Ney Fayet de Souza Júnior | André da Rocha Ferreira
Projeções da “Criminologia Dialética” na Teoria do Delito: a Construção de um Modelo Integrado Crítico de Ciências Criminais em Roberto Lyra Filho, de Salo de Carvalho
Uma Lírica Efeméride. Notas sobre os Cinquenta Anos de Criminologia Dialética, de Vera Regina Pereira de Andrade | Marcel Soares de Souza
Roberto Lyra Filho, uma Arqueologia do Campo Penal: Tensões Epistêmicas e Hibridações Paradigmáticas, de Wanda Capeller
Os textos e o representativo painel de autoras e autoras, conquanto se concentrem no legado de Roberto Lyra Filho contido na obra copernicana de seus estudos criminológicos, abrangem também o campo da filosofia e da teoria crítica do Direito, para o qual converge seus mais agudos ensaios.
Conforme dizem Salo de Carvalho e José Carlos Morteira Silva Filho, autores e co-organizadores da edição, em seu texto de apresentação: “a síntese da força inovadora de “Criminologia Dialética”, trabalho mais relevante de Lyra Filho nas ciências criminais é a “certidão de nascimento” da Criminologia Crítica brasileira. Mas para além da abordagem de questões próprias das ciências criminais, “Criminologia Dialética” também inaugura a crítica de Lyra Filho no campo da Teoria Geral do Direito, pois contém a proposição de uma revisão da teoria das fontes a partir do pluralismo jurídico”.
Por isso que, “a data comemorativa e a importância histórica do trabalho para a crítica do Direito no Brasil incentivaram a propor um estudo coletivo que pudesse revisitar o texto original de Lyra Filho, prestando-lhe a devida Apresentação homenagem, e discutir a sua atualidade. Somos muito gratos pelo privilégio de poder organizar esta obra comemorativa junto com nosso mestre José Geraldo de Sousa Junior e de ter entre as autoras e autores tantas pessoas representativas e importantes para nossa própria trajetória, seja caminhando ao nosso lado, seja nos orientando e nos mostrando o caminho”.
Em Roberto Lyra Filho, segundo ele mesmo, conforme digo no meu prefácio, apontando para o que está na Carta Aberta a um Jovem Criminólogo, um programa atualizado para os fundamentos que lançou com a Criminologia Dialética, na perspectiva das questões teóricas, técnicas e de práxis que dele resultam, se encarna a dupla missão dos intelectuais: “a inflexibilidade dos princípios e a flexibilidade conjuntural das táticas”, pois, “se afrouxam os princípios a caverna platônica os engole; se enrijecem as táticas, ajudam sem querer o adversário, pelo triunfalismo arrogante com que escondem a própria impotência”, sobretudo quando, em realidades como atualmente no Brasil, “a alienação nunca é morna; é escaldante e dramática. A realidade queima, as repressões são brutais; a miséria popular, extrema; a demissão, um escândalo. É preciso a inconsciência absoluta ou a completa falta de caráter para dormir no ‘berço esplêndido’”. Por isso ele chama a atenção para “teorias despistadoras, o distinguo solerte dos intelectuais desfibrados e autocomplacentes, as erudições de fachada”, e adverte para “as concessões [que] adquirem boa consciência, porque se apresentam como abordagem matizada, complexa, cheia de manhosas ‘divergências’, ante a forma reta do pensar, [para lembrar] A Curva da Estrada, a magistral obra de Ferreira de Castro que lhes descreveu a origem e o desfecho”.
50 anos depois da publicação da Criminologia Dialética, a formidável antecipação de Roberto Lyra Filho continua animando os debates de atualização da Criminologia Crítica. E mais, nele, espraiado para uma concepção bem mais geral projetada para a teoria crítica do Direito, no projeto por ele esboçado, de um Direito Achado na Rua.
É que cuidei de expor em O Direito Achado na Rua: Concepção e Prática (SOUSA JUNIOR, José Geraldo de. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris,2015), contra alguns que viam datadas e esgotadas na conjuntura pós-constituinte as proposições de O Direito Achado na Rua e, porque estivessem os enunciados de Roberto Lyra Filho represados no seu momento histórico, já superado. Ao contrário do que considera tais objeções, essas posições revelam críticos que sequer chegaram a estudar ou absorver “no processo dialético, em vista da violência que vivemos nos anos 90, especialmente, na construção do conhecimento, com o celebrado fim das utopias, o fim da história e instalação de um pensamento único”, como se demonstrou sobejamente no balanço da fortuna crítica desse projeto, formalizado ao final dos anos 1980, à luz de tudo que se exibiu no Seminário O Direito como Liberdade: 30 anos do Projeto O Direito Achado na Rua (SOUSA JUNIOR, José Geraldo de et al (orgs). Série O Direito Achado na Rua: Introdução Crítica ao Direito como Liberdade. Brasília: Editora UnB/Editora da OAB Nacional, 2021
José Geraldo de Sousa Junior é graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal – AEUDF, mestre e doutor em Direito pela Universidade de Brasília – UnB. É também jurista, pesquisador de temas relacionados aos direitos humanos e à cidadania, sendo reconhecido como um dos autores do projeto Direito Achado na Rua, grupo de pesquisa com mais de 45 pesquisadores envolvidos.
Professor da UnB desde 1985, ocupou postos importantes dentro e fora da Universidade. Foi chefe de gabinete e procurador jurídico na gestão do professor Cristovam Buarque; dirigiu o Departamento de Política do Ensino Superior no Ministério da Educação; é membro do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, onde acumula três décadas de atuação na defesa dos direitos civis e de mediação de conflitos sociais.
Em 2008, foi escolhido reitor, em eleição realizada com voto paritário de professores, estudantes e funcionários da UnB. É autor de, entre outros, Sociedade Democrática (Universidade de Brasília, 2007), O Direito Achado na Rua. Concepção e Prática 2015 (Lumen Juris, 2015) e Para um Debate Teórico-Conceitual e Político Sobre os Direitos Humanos (Editora D’Plácido, 2016).