O Campo Social do Direito e a Teoria do Direito Indigenista

Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito.

Luiz Henrique Eloy Amado (Eloy Terena). O Campo Social do Direito e a Teoria do Direito Indigenista. Tese de doutorado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2022, 223 f.

         A Tese de que trata este Lido para Você foi apresentada, defendida e aprovada perante a Banca Examinadora, da qual fui membro e que foi integrada pelas professoras e professores Ana Maria Motta Ribeiro, Orientadora – PPGSD/UFF; Gizlene Neder, Examinadora Interna – PPGSD/UFF; Carlos Frederico de Souza Filho, Examinador Externo – PPGD/Puc-PR; Eloísa Machado, Examinadora Externa – FGV-SP; e Antonio Carlos de Souza Lima; Examinador Externo – Museu Nacional/UFRJ.

            Para mim foi uma satisfação amplificada em razão de múltiplas razões, carregadas de emotividade.

A primeira, o poder examinar um trabalho de elevado nível político-epistemológico, no ano de celebração do bicentenário da independência do Brasil em relação à metrópole colonizadora, mas que em si representa uma ação concreta de descolonização porque defendido por uma autoria orgulhosa de sua identidade e que se apresenta autônoma no salto tremendo entre a sua condição originária no momento da conquista, entre o que já fora a sua representação como  bestializado, desalmado, silvícola, para a afirmação plena do tornar-se humano, tal qual considerava Hegel, um processo inscrito na experiência da História. Um salto que liga a Sublimis deus (1537, Papa Paulo III, reconhecendo ao índio a condição de pessoa humana) à Constituição brasileira de 1988, constituição cidadã, reconhecendo os indígenas sujeitos de sua própria história, instituintes de direitos e de cidadania plena. Assim como o Autor da tese, que em conjunto com seus parentes, afirmou seu lugar acadêmico na descolonização da universidade e seu currículo, nas lutas afirmativas por inclusão e desse lugar, também a descolonização da tribuna do Supremo Tribunal Federal, para afirmar alto e em bom som, que sua história cria um direito autêntico, próprio, um outro direito, anterior ao estado e com jurisdição autônoma.

A segunda, o poder compartilhar com brilhantes colegas, entre eles amigos diletos, que nessa banca se reencontram e renovam valores e conhecimentos que partilham.

A terceira, é estar presente num evento acadêmico, no espaço de um programa de pós-graduação, um dos primeiros propriamente interdisciplinares credenciados na pós-graduação em direito, que me toca fundamente por ter sido o parecerista ad hoc, designado pelo coordenador de área Aurélio Wander Bastos, para estar presente na sessão do Comitê da Capes que o aprovou. Foi uma novidade não só na grande área de ciências sociais aplicadas, certamente a primeira no campo jurídico, estrito senso.

Do que trata a Tese, remeto ao seu resumo:

A tese tem por objeto o direito produzido pelo Estado para os povos indígenas, ou seja, um direito imposto, construído e aplicado sem a participação dos povos originários. Para analisar tal direito, elegeu-se três fatores determinantes que devem ser levados em consideração na elaboração daquilo que estamos denominando de teoria do direito indigenista, quais sejam: a) a política indigenista brasileira analisada em suas várias conjunturas históricas, desde o Brasil colonial aos dias atuais; b) o contexto político-econômico em que as normas jurídicas foram produzidas; e, c) a análise situacional dos povos indígenas consideradas em sua totalidade, ou seja, não como povos estanques na história e isolados do mundo, mas como agentes políticos imersos e diretamente afetados por estruturas do sistema-mundo. O objetivo é apresentar um produto do somatório de experiências e reflexões forjadas na prática da advocacia indígena. Para tanto a teoria que se pretende ofertar terá como base a experiência da atuação judicial de defesa de comunidades indígenas, a partir da experiência do Departamento Jurídico da APIB e COIAB, especialmente no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF) e instâncias internacionais de direitos humanos. O método adotado é o materialismo histórico dialético para entender como as estruturas econômicas e políticas impactam os territórios indígenas e a produção de um direito imposto. Ao fim, busca-se oferecer uma leitura crítica de um direito que, mesmo sendo produzido para servir ao interesse do capital, tem sido ocupado pelos povos indígenas e manejados numa fricção jurídica intercultural.

Leal ao enunciados do programa em que o trabalho se desenvolveu, o Autor  articula fundamentos retirados de teorias de sociedade e de justiça, para orientar sua própria investigação. De fato, essa é a indicação de J J Gomes Canotilho, que em sua Teoria da Constituição e do Direito Constitucional afirma fazer possível liberar o conhecimento para romper com o formalismo estiolante do jurídico e, orientar-se pelo olhar vigilante sobre as exigências do justo, abrindo-se a outros modos de realização do Direito.

O Autor, com efeito, fixa bem esse ponto de partida:

Este trabalho possui dois  campos  reflexivos,  tendo  em vista que  foi desenvolvido  no  âmbito  de   um  programa  de  pós-graduação  em  sociologia  e direito.   A leitura   dos clássicos da teoria sociológica e   da  teoria  do  direito,  aliado  à  prática  da  advocacia  indígena, nos   permite  oferecer  uma  análise  do  desenvolvimento  da  política  e  do  direito  indigenista  brasileiro.  Resta consignar de  maneira preliminar   que  partimos do   pressuposto  fundamental que   no  Brasil, não   existe  apenas  um  direito  indígena,  mas vários   direitos  indígenas, que   nascem  da  aldeia e   possuem  resguardo  jurídico,  e  portanto,  devem  ser  respeitados. Entretanto, neste   trabalho não   estou analisando  o  direito  indígena,  mas  sim  o  direito  indigenista,  aquele direito   produzido  e  imposto pelo Estado aos povos indígenas.

Por se tratar de um  trabalho  sócio  jurídico realizado   por  advogado  indígena com    atuação  nas  principais  organizações  indígenas, costuma-se  esperar  que  o   mesmo  aborda  sobre  os  regimes  jurídicos  próprios  presentes  nas  comunidades,  sobre  a  teoria  da  jusdiversidade ou  sobre  o  pluralismo  jurídico  e  os povos   indígenas. Mas, frisa-se, aqui  está  se  propondo  entender  o  direito  indigenista,  e  ao  analisá-lo,  reconhecer  que  é  direito  ocidental imposto,  em   grande  medida  criado  pela  ausência  da  efetiva participação  indígena,   mas  que  mesmo assim,  os   povos indígenas   tem  se  posto  a  entender,  dialogar  e  utilizar  esta  estrutura jurídica   desenhada pelos não indígenas.

Destaco no trabalho de Luiz Eloy, uma consideração que tem dimensão epistemológica, se assim consideramos, com Boaventura de Sousa Santos, que o conhecimento é simultaneamente, consciência e existência, vale dizer, ação no mundo e biografia. Noto que isso está nítido na atitude de pesquisa do Autor, dizendo de certo modo, o mesmo que disse Ailton Krenak ao receber o título de Doutor Honoris Causa na UnB, que a distinção não o exaltava como pessoa, senão como expressão de uma biografia de povo, um reconhecimento ao coletivo que marca a formação de sua identidade comunitária.

Diz Eloy que “de  igual  modo,  o  texto  é  resultado  de  trabalho  coletivo,  pois  grande  parte  das reflexões  empossadas  tem  origem  na  árdua  atuação  no  âmbito  do  Departamento Jurídico   da Articulação dos  Povos  Indígenas  do Brasil (APIB),  da  Coordenação das Organização  Indígenas  da  Amazônia  Brasileira  (COIAB)  e  do  Conselho do  Povo   Terena,  que  reúne  um  time  jurídico  excepcional  e  tem  atuação  dialógica com   outros  importantes  jurista  que  acompanham e apoiam a luta dos povos indígenas no Brasil”,. E que “é  importante  que  se  registre que        a  pandemia    do Covid-19  impactou  o  andamento dessa  pesquisa,  o  período fora   do Brasil,   em  Paris,  que  seria  dedicado  à  escrita, foi   sobrecarregado  pelo  sentimento de   perda  e  exaustão. A  rotina  diária  de  contabilizar mortes  indígenas,   aliado  à  omissão  sistemática  do  Estado, exigiu   dedicação total   ao trabalho   na APIB,  COIAB  e   Conselho  Terena.  Se não  bastasse,  a  perda de   familiares neste   contexto,  ora  paralisou,  ora acelerou   a escrita. Mudou os  rumos  da  pesquisa e  proporcionou   o trabalho   que  se apresenta”.

 Assim ele arremata: “Esta tese de doutorado carrega  vários  sentidos que   vão desde     a dimensão    pessoal,   passando  pela  característica política   e alcançando   a  sua  importância  acadêmica.  Ela foi desenvolvida   num período   muito conturbado para   os direitos   dos povos indígenas  do  Brasil.  Isto  porque,  como  se  verá  no  desenrolar  da  escrita,  mesmo  a  Constituição  Federal  de  1988 tendo   consagrado  a proteção  constituição   a  tais  povos,  assumindo  o  Estado  brasileiro o   compromisso  com  os povos   originários, presenciamos   os  mais  severos  ataques  a  estes  direitos,  de  forma  declarada  e  institucionalizada,  a  violência  que sempre  abateu  povos   e  comunidades,  nas profundezas  do  nosso   Brasil,  agora  se  irradia  da  conduta  institucionalizada  dos poderes constituídos em Brasília”.

Chamam a atenção notícias seguidas que indicam uma continuada postura de conflito entre a Funai, o órgão governamental incumbido da proteção dos direitos indígenas, o sujeito da diretriz constitucional de reconhecimento e proteção.

Anoto, em artigo de opinião e de divulgação que escrevi sobre esse assunto (https://www.brasilpopular.com/lealdade-ao-dever-constitucional-de-protecao-a-funai-os-indios-e-o-direito/), alguns destaques que chamam a atenção:  https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/10/presidente-da-funai-provoca-investigacao-da-pf-contra-servidor-que-defendeu-indios.shtmlhttps://oglobo.globo.com/politica/presidente-da-funai-diz-que-vai-processar-indigena-que-integrou-comitiva-de-bolsonaro-na-onu-24191574https://apiboficial.org/2021/10/05/apib-e-dpu-pedem-afastamento-do-presidente-da-funai-na-justica/ .  

Esse último registro dá conta de que a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) ingressou, no marco dos 33 anos da promulgação da Constituição Federal (CF), com uma Ação Civil Pública (ACP) na Justiça Federal de Brasília (JF-DF) para pedir o afastamento do Presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai).

Não só nesse tema, como igualmente na questão do racismo, à luz do que se passa, também como conflito de interesses entre a Fundação Palmares e as mobilizações antirracistas no Brasil, essa postura antidemocrática e hostil à Constituição fica cada vez mais evidente.

Não é uma postura nova, ela se revela em toda vocação autoritária e anti-povo. Ainda que a Constituição atual, artigos 231 e 232 tenha reconhecido a capacidade ativa dos índios, ela manteve o dever de proteção pelo Estado dos direitos originários desses povos, tanto que atribuiu ao Ministério Público acompanhar todos os atos que digam respeito à salvaguarda desses direitos e manteve como obrigatoriedade governamental, não havendo mais o regime de tutela, de exercitar essa obrigação, atribuindo a Fundação Nacional do Índio (Funai) como órgão indigenista oficial responsável pela promoção e proteção aos direitos dos povos indígenas de todo o território nacional.

Ora, é legítimo o repúdio indígena aos posicionamentos hostis que a partir desse órgão, começam a caracterizar a quebra de lealdade ao dever constitucional de Proteção, violando os direitos indígenas.

É preciso lembrar que mesmo no curso da ditadura do regime imposto em 1964 e ainda sob a égide de uma Constituição de traços colonialistas, que não reconhecia a capacidade plena aos indígenas, mantendo-os subalternos e tutelados, nunca se perdeu o horizonte emancipatório de respeito aos seus direitos, usos e tradições originários.

Num artigo que publiquei no Jornal de Brasília, edição de 29/04/1984 –Os Índios e o Direito –trato desse tema. Nele aludo a decisão proferida em mandado de segurança que estudantes terenas, representados por membros da Comissão de Direitos Humanos, da OAB-DF, impetraram contra a Funai, ocasião para que o íntegro juiz Dario Abranches Viotti, da Justiça Federal em Brasília, reconhecendo a incompatibilidade de interesses entre o tutor e seus assistidos, nomeou curador especial um dos advogados, para o fim específico de representa-los na ação. Essa curatela especial coube a mim, um dos advogados da OAB, investido no processo pelo magistrado.

Essa decisão não trouxe, a rigor, eu disse no artigo, nenhuma inovação técnica. A remoção do tutor, no âmbito da legislação cível, ou a interdição de direitos, como pena acessória, nos casos de incompatibilidade manifesta, na esfera penal, implicam na perda do exercício da tutela, constituindo alternativas adequadas para a verificação da responsabilidade do tutor em face de suas obrigações para com o tutelado.

Tanto é assim que, no caso relatado, o Juiz simplesmente adotou a solução sugerida pela lei processual civil, identificando, na situação litigiosa, uma hipótese de colisão de interesses.

O inusitado da medida não chega a ser, sequer, o seu pioneirismo jurisprudencial, embora mereça relevo a determinação, no particular, que resultou em abandono de postura, evidentemente inibida da magistratura brasileira. O que repercute nessa decisão, sem precedente a nível judiciário, é o seu alcance instrumental para a defesa de interesses e direitos diferenciados no seio da sociedade civil, como garantia de acesso à Justiça de segmentos sociais dela alienados.

Com efeito, relativamente às comunidades indígenas, a decisão rompe, definitivamente, o círculo férreo com o qual o tutor especial procura privatizar as relações entre os índios e o Estado, isolando as suas reivindicações específicas do conjunto das lutas gerais da sociedade pelos direitos de cidadania.

A decisão, em todo o seu alcance, aponta para o caráter público dessas reivindicações e confirma o Poder Judiciário na condição de instância privilegiada para a fundamentação jurídica de suas implicações não vislumbradas. Assim, por exemplo, o sentido da fidelidade como categoria cogente do tipo de tutela especial, suscetível de avaliação plena em sua peculiaridade teleológica.

Há, assim, incindível entre cidadania e Justiça. Esse vínculo, aliás, foi acentuado pelo ex-Presidente da OAB-DF Antonio Carlos Sigmaringa Seixas (pai do advogado Luiz Carlos Sigmaringa Seixas, patrono do Grupo Prerrogativas que reúne juristas pela justiça e pela democracia) em sua bela tese sobre a democratização da justiça, apresentada no 1º Encontro de Advogados do Distrito Federal. Nela, mostra o autor o quanto a estrutura judiciária reflete a face do Estado que a organiza, esclarecendo que a condição para a concretização de uma justiça democrática é a própria reconstrução democrática da sociedade. Tanto mais, diz ele, quanto seja necessário para elaborar, inclusive, teoricamente, instrumentos jurídicos de intervenção compatíveis com a exigência atual da prática da cidadania.

Nesse contexto é que, demonstra Sigmaringa Seixas, se coloca a necessidade imperiosa de ampliação da tutela jurisdicional para a garantia de acesso à Justiça de pretensões fundadas na defesa de interesses difusos ou coletivos da sociedade.

E este é, precisamente, o campo de exercício da concepção atualizada da cidadania, compreendida como espaço de emergência de novos direitos. Na verdade, um processo de busca de reconhecimento de valores, elaborados a partir das contradições da estrutura econômico-social e que reclamam instrumentalização política e fundamentação jurídica, até como direitos humanos. Aliás, conforme o que fez o Juiz Dario Abranches Viotti, aliás um homem conservador, mas um juiz íntegro, cujo desvelo pela justiça mais expõe os maus juízes que oficiam hoje no país (conferir aqui no Jornal Brasil Popular o meu artigohttps://www.brasilpopular.com/os-integros-e-os-maus-juizes).

A tese ganha relevo e alcança por todos esses motivos os requisitos de ineditismo do estudo e revela o salto doutoral que a articulação teoria e prática requer a trabalhos que servem não só para interpretar o mundo mas a orientar ações políticas que se disponham a nele agir para transformá-lo. Cuida-se, lembra Marilena Chauí, a propósito do pensamento dialético de Roberto Lyra Filho e de sua concepção do direito como emancipação direito achado na rua, de abrir a consciência para saltar da história para a política, pela mediação do direito que desaliena, emancipa e humaniza.

Nessa dimensão aberta de uma consciência que se abre reflexivamente para a práxis transformadora, afirma Eloy que “A importância  política do trabalho está ligada  à  realidade  social.  O tema central  é  o  direito  dos  povos  indígenas  e  sua  luta  está  ligada  às  lutas  sociais  empreendidas  no  país.  Como se  verá,  estou  defendendo  neste  trabalho,  a  existência  de  um  campo  específico  do  direito  público  interno  brasileiro  que trata   dos  interesses  e  direitos  dos  povos  indígenas  – que   neste  momento  estou  chamando  de  direito indigenista.   Ora,  isto tem   implicação  direta ao   desenvolvimento  da  política  brasileira,  pois  são  interesses  que  estão  conflitando  e  se  relacionando  com  o  campo  econômico,  social  e  político.  Nos  últimos  anos  assistimos  temas  relacionados aos   direitos  dos  povos  indígenas  na  puta  do  Supremo  Tribunal  Federal   ,  do  Congresso  Nacional  (Câmara  e Senado)   e  dos  discursos do   chefe  do  poder  executivo,  presidente  Jair Bolsonaro .  De  igual forma,   no  cenário  internacional  fica  evidente  a  importância do   tema, pois   ocupou as   discussões das   Nações  Unidas ( ONU)  ,  da Comissão   Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e do Tribunal Penal Internacional (TPI)

 E, “no que tange a  justificativa  de  ordem científica, o tema  merece profunda reflexão  por  parte  da  academia. Ao   tempo  que  se  reconhece  os outros   direitos e   sistemas  de  justiça próprio   dos  povos  indígenas, põe-se  como  missão   inicial  analisar  e  estruturar  o  direito  produzido pelo  Estado   para os   povos  indígenas  (direito  indigenista).  Para tanto, não   está  se  propondo  a  fazer  uma análise   pura  da lei, seguindo   a  ortodoxia  jurídica,  mas  se  propõe a   fazer  uma  análise  sociojurídica,  olhando  não apenas   para  a  letra  fria  da norma,   mas  também para  as   forças sociais  ( movimento indígena),   para  desenvolvimento  da  política  indígena  e os   interesses econômicos que conflitam com tais direitos”.

Na linha da interdisciplinaridade que caracteriza o Programa da UFF, a bibliografia rica arrolada pelo Autor está apta a sustentar a sua tese. Ela, aliás, se faz viva na Banca para conduzir o debate de conteúdo. Eu só sugiro ao Autor que incorpore a sua reflexão futura, quando retorne ao âmbito teórico do pluralismo jurídico e ao constitucionalismo latinoamercano emancipatório participativo, os estudos imprescindíveis de Rosane Freire Lacerda, professora da UFPE e antiga assessoria jurídica do CIMI, juntamente com Paulo Machado Guimarães, quando era seu coordenador o querido amigo Antonio Brand, tão afetuosamente honrado pelo Autor. Com Paulo Guimarães, formulamos nos anos 1980 a tese da legitimidade ad causam da Comunidade Indígena Pataxó Hã Hã Hãe (não os caciques ou capitães, ou a Funai), para fundamentar a retomada de seus territórios tradicionais. Foi um de meus referências para balizar a tese que apresentei na XIII Conferência Nacional da Ordem dos Advogados, em 1990 (está nos Anais) “Movimentos Sociais – a Emergência de Novos Sujeitos: o Sujeito Coletivo de Direito”, categoria – sujeito coletivo de direito – que se constitui como um dos fundamentos de investigação de O Direito Achado na Rua, em sua concepção e prática.

 Refiro-me à Dissertação e à Tese defendidas por Rosane na UnB, que tive o privilégio de orientar: Diferença não é incapacidade: gênese e trajetória histórica da concepção da incapacidade indígena e sua insustentabilidade nos marcos do protagonismo dos povos indígenas e do texto constitucional de 1988. (Dissertação, 2007):

Este trabalho trata da questão da capacidade civil dos indígenas no Brasil e de sua sujeição ao regime tutelar especial previsto e m leis infra−constitucionais. Partindo do pressuposto da ruptura histórica da Constituição Federal de 1988 com o antigo paradigma da incorporação dos índios à comunhão nacional brasileira, busca−se compreender e m que medida tal ruptura introduziu. ou não, alterações na compreensão e na prática dos juristas e das instituições do Estado brasileiro a respeito do tema. No último capítulo é feito um diagnóstico do tratamento dado pela literatura jurídica à questão da capacidade civil indígena tanto na fase da vigência do Código Civil de 1916, quanto a partir do Código Civil de 2002, e como tal discussão se insere no âmbito das práticas dos poderes do Estado. Tendo e m vista as resistências da maioria dos atores jurídicos na compreensão da questão da capacidade civil indígena a partir dos novos parâmetros constitucionais, a pesquisa aponta para a importância da sua análise no âmbito da sistemática adotada pelo Direito Civil Constitucional, para ali potencializar a superação da concepção da incapacidade indígena. Trata−se, enfim, de uma pesquisa documental, fruto das inquietações da autora enquanto advogada atuante há muitos anos na defesa dos direitos indígenas, e que identifica na questão da tutela indígena u m dos problemas ainda enfrentados por aqueles povos na busca pelo respeito à sua autonomia e diversidade étnica e cultural.

“Volveré, y Seré Millones”: Contribuições Descoloniais dos Movimentos Indígenas Latino Americanos para a Superação do Mito do Estado-Nação (Tese, 2014, prêmio Capes):

A tese trata da emergência do modelo plurinacional de Estado na América Latina a partir das demandas históricas dos povos indígenas. São demandas pelo seu reconhecimento enquanto sujeitos políticos e jurídicos autodeterminados, no marco do Estado territorial moderno. O foco central está na importância e contribuição dos movimentos indígenas latino-americanos, em especial os da Bolívia, Equador e Brasil, para a construção de um modelo de Estado que desafie e supere as relações coloniais e eurocêntricas de poder e de conhecimento presentes no modelo de Estado-nação. O trabalho busca responder a duas indagações: (a) o chamado modelo “plurinacional” de Estado consiste no simples reconhecimento da diversidade étnica e cultural da sociedade e na concessão, a estas identidades diversas, de direitos específicos? e (b) o Estado Brasileiro, tendo em vista os reconhecimentos do art. 231 da Constituição Federal de 1988, possui os elementos ou pode ser considerado um Estado “plurinacional”? A hipótese é a de que o Estado plurinacional, longe do simples reconhecimento da heterogeneidade e da concessão de direitos específicos, constitui um modelo cujas bases axiológicas e institucionais são construídas a partir da pluralidade de concepções éticas, jurídicas e políticas próprias das diversas identidades “nacionais”. No caso do Brasil, a hipótese é a de que apesar do reconhecimento da diversidade étnica e cultural expressa no art. 231 da CF/88, o modelo institucional de Estado continua uni-nacional e marcado pelas relações coloniais de poder. O objetivo geral do trabalho é identificar e analisar, a partir das reivindicações e contribuições políticas dos movimentos indígenas e de seus reflexos no movimento do chamado Novo Constitucionalismo Latino-americano, o significado e a importância constitucionais do modelo “plurinacional” de Estado, em especial as possibilidades que este oferece para a ruptura com históricas relações de dominação no interior de Estados marcados pela diversidade étnica e cultural. A análise teórica tem por base os estudos sobre a “colonialidade” (Quijano), em especial as modalidades “colonialidade do poder” (Quijano), “do saber” ou “epistêmica” (Mignolo e Sousa Santos), e “do ser” (Maldonado-Torres). Considerando a ideia de homogeneidade étnica e cultural como subjacente à concepção da identidade necessária entre Estado e nação, e como uma produção ideológica baseada no não reconhecimento da diversidade, afirma-se a incapacidade do Estado-nação na América Latina para dar conta de sua pretensão de promover uma integração social democrática, justa y solidaria. Procura-se demonstrar, na trajetória histórica do constitucionalismo latinoamericano pós-independência, que os Estados uni-nacionais na região desenvolveram-se e constituem-se enquanto espaços de manutenção das relações coloniais de poder, de ser e de saber, que invisibilizam a diversidade étnico-cultural e colocam os indígenas em condições de subalternidade política e epistêmica. A partir daí são analisadas as históricas lutas de resistência indígena a este quadro, bem como as mobilizações em torno da recente construção dos modelos plurinacionais de Estado na Bolivia (2009) e Equador (2008), como expressões de uma atitude “descolonial” (Quijano), fundada na “desobediência epistêmica” (Mignolo) e na “interculturalidade crítica” (Walsh). Conclui-se que no Novo Constitucionalismo Latino-Americano as demandas indígenas trouxeram a plurinacionalidade como uma tentativa de construção um novo modelo de Estado, em bases descoloniais.

Para a vertente crítica que pensa o Direito como emancipação e o compreende como criação do social, a hipótese do pluralismo jurídico e a condição da insurgência, são critérios constitutivos do campo, das referências possíveis de teorias de sociedade e de justiça, e de qualquer consideração que se elabore sobre o tema.

Assim, por exemplo, em minhas leituras, articulando questões sociais e possibilidades teóricas, com esse objetivo, quando tratei de esboçar a minha crítica sobre o processo de formação, conforme por exemplo, meus primeiros estudos, se mostrou inafastável abrir um capítulo sobre a pluralidade de ordenamentos e, simultaneamente, na sequência, situar a questão nas articulação entre as condições sociais e as possibilidades teóricas que abrem ensejo para a materialização do jurídico, na tensão dialética entre o instituinte e o instituído.

Algo, anota Marilena Chauí, que abre a perspectiva para a “apreensão do Direito no campo das relações sociais e políticas entre classes, grupos e Estados diferentes [que] permite melhor perceber as contradições entre as leis e ajustiça e abrir a consciência tanto quanto a prática para a superação dessas contradições [o que] significa abrir o Direito para a História e, nessa ação, para a política transformadora”.

Na consideração dessas interpelações, tanto políticas quanto epistemológicas, nenhum estudo terá sido desenvolvido sob a perspectiva da crítica jurídica e dos direitos humanos, sem que se estabeleça um vínculo de interlocução com a precedência de pesquisas e de análises de Jesús Antonio de la Torre Rangel, na sua sofisticada e engajada concepção de Derecho que Nace del Pueblo como Derecho Insurgente,

De fato, no plano teórico, considerando as principais abordagens, todos os autores e autoras (pelo menos aqueles com os quais mais proximamente mantenho diálogo) – Boaventura de Sousa Santos, Carlos Maria Cárcoca, Oscar Correas, Raquel Yrigoyen Fajardo, David Sanches Rubio, Miguel Pressburger, Miguel Baldez, Luiz Edson Fachin, Antonio Carlos Wolkmer, Salo de Carvalho, José Carlos Moreira Silva Filho conformaram suas aproximações, em diálogo constante e intenso com o professor de la Torre Rangel, entre esses Carlos Frederico Marés de quem adota várias expressões, principalmente quando adverte para o risco da técnica jurídica converter-se emconcepção univocista do jurídico, operando como um ‘procedimento mata Direito’.

Na articulação dos fundamentos do pluralismo e da insurgência enquanto filosofia e teoria do Direito que nasce do povo, assertivamente, “uma nova teoria do Direito”, desde 1986, com El Derecho que nasce del pueblo, depois, em 2012, com El Derecho que sigue nascendo del pueblo. Movimientos sociales y pluralismo jurídico; e agora. 2022, com El Derecho que Nasce del Pueblo como Derecho Insurgente, de la Torre Rangel percorre um caminho disciplinado, imaginativo e criativo que consolida uma referência para o campo.

Nas suas próprias palavras, sempre atualizando “la exposición del pluralismo jurídico como base y mejor entendimento de la propuesta y recogemos varias de las experiências analizadas” nesse formidável percurso, com a novidade que se estriba “em que el pluralismo jurídico lo reforzamos teoricamente; analizamos otras nuevas experiências sociojurídicas” e, com mais pressupostos teóricos, “destacando la categoria de derecho insurgente – direito insurgente – desarrolhada por juristas brasileños militantes em la asesoría jurídica popular, para analizar las experiências de Derecho que nace del pueblo”.

Folgo em me encontrar junto com colegas brasileiros, nesse diálogo interpretativo. Esse diálogo estabelecido desde antes, nas reflexões sobre o tema do pluralismo jurídico, já me inscrevera entre as referências do professor De la Torre Rangel, sob a perspectiva de minha abordagem enquanto direito achado na rua (SOUSA JUNIOR, 2007). Agora, nesta nova obra, o professor De la Torre Rangel me inscreve em suas referências com um ítem de seu livro O Direito Achado na Rua, como fundamento teórico y su relación com otras miradas críticas al Derecho. E o faz, fico satisfeito,  porque ele percebe a utilização de uma racionalidade analógica (categoria hermenêutica fundamental na concepção do Autor), que expressa “no una visión unívoca, que pretenda uniformar las posiciones críticas del Derecho desde los empobrecidos em sus derechos, podemos decir que El Derecho Hallado em la Calle es estrictamente derecho alternativo, es outro derecho respecto del derecho positivo, expressión éste muchas veces de injusticia; parte, además, de aceptar um pluralismo jurídico comunitário participativo, que constituye su base, al aceptar el Derecho como uma producción social em processo; tabién pude identicarse com el derecho insurgente, ya que em ciertos momentos los sujetos sociales oponen al Estado y a las clases sociales hegemónicas um derecho em resistência y lucha política”.

Uma mais estendida e circunstanciada aproximação entre O Direito Achado na Rua e o Direito Insurgente, foi apresentada pelo professor De la Torre Rangel, durante o Seminário Internacional O Direito como Liberdade 30 Anos do Projeto O Direito Achado na Rua, em sua contundente comunicação Constitucionalismo Achado na Rua em México: de los acuerdos de San Andrés al concejo indígena de gobierno.

As experiências registradas no México, tendo como base as lutas sociais por emancipação, têm o caráter de uma revisão crítica da historiografia do país, na percepção da insurgência e do processo instituinte de direitos, repondo o tema do constitucionalismo desde baixo, nas anotações de planos e acordos estabelecidos nos embates para estabelecer projetos de sociedade. Relevo para os acordos de San Andrés, pela conformação constitucional que os caracterizam.

É importante “recordar que o constitucionalismo é permanente tentativa de se instaurar e se efetivar concretamente a exigência idealizante que inaugura uma modernidade no nível da organização de uma sociedade complexa, incapaz de lançar mão de fundamentos absolutos e que, por isso, só pode legitimar seu próprio sistema de direitos na medida em que os potenciais podem se reconhecer como coautores e autoras das normas que os regem. Ou seja, ou o direito é constitucionalmente achado na rua e nas ruas, e com as ruas, é construído e reconstruído de forma plural e inclusiva, ou, sem dúvida, tende-se a privatizar o próprio Estado, mediante a colonização do direito por uma lógica simplista binária de cunho plebiscitário e na da democrática, pois infensa a qualquer eficaz de bate”.

Para o constitucionalista português J. J. Gomes Canotilho, em sede de debate que envolve teorias de sociedade, teorias de justiça e teorias constitucionais, cuida-se de ter atenção à multiplicidade de sujeitos que se movem no debate constitucional contemporâneo que tende a abrir expectativas de diálogo político estruturado na linguagem do direito, gerando na expressão dele, “posições interpretativas da Constituição” que emergem desse processo  e formam uma luta por posições constituintes, luta que continua depois de aprovada a constituição (CANOTILHO, J. J. Gomes. Cf. Entrevista que me concedeu: Pela Necessidade de o Sujeito de Direito se Aproximar dos ‘Sujeitos Densos’ da Vida Real.  Constituição & Democracia. Brasília: Faculdade de Direito da UnB, n. 24, julho de 2008, p.12-13), luta travada pela disposição a ir para o meio da rua, pois “do outro lado da rua, o ‘direito achado na rua’ e, perante o sangue vivo que brota dos vasos normativos da realidade e a sedução de um direito outro, ao direito formal das constituições, códigos e leis, compreende-se que o discurso hermenêutico dos juristas mais não seja que um manto ocultador do insustentável peso do poder”.

Ao final uma nota para novas aproximações a partir do diálogo que a instigante reflexão do professor Jesús Antonio de la Torre Rangel provoca, considerando que a sua obra atual, em ser uma continuidade adensadora de pressupostos epistemológicos para a crítica jurídica, é um completo catálogo de experiências confirmadoras do direito alternativo, do uso alternativo do Direito, do pluralismo jurídico e, ao fim e ao cabo, do direito insurgente, que surge do povo, pela emergência de sujeitos coletivos de direitos, que se inscrevem nos movimentos sociais, protagonistas de sua própria experiência de humanização e de emancipação, já que o humano é projeto, experiência na história: “El derecho insurgente, del que trata este libro, forma parte de um processo de liberación de la alienación u opresión; se opone a la legalidade de la injusticia. Em el texto hemos destacado, sobre todo, las luchas indígenas y campesinas, por la autonomia y la defensa del território, como uma práctica jurídico-política de pueblos índios y campesinos; práctica en que [se materializa] el derecho que nace del pueblo como derecho insurgente”, tanto como aplicação alternativa a partir do jurídico instituído, com abertura hermenêutica para a expansão de categorias e de conceitos, quanto na perspectiva para a emergência de outro direito, este propriamente insurgente, orientado por outro projeto de sociedade e de interrelações re-descritas a partir das lutas sociais para um direito verdeiramente emancipatório.

A  tese, tal a conclusão de seu Autor,   “trouxe  um  somatório  de  reflexões  forjadas  a  partir  da  experiência.  No  caso dos  povos  indígena  esta  experiência  é  a  resistência  qualificada  pelo  contínuo  processo  de  fricção  jurídico  estatal.  Pois  mesmo  sendo  povos  autônomos,  detentores  de  sistemas  próprios,  trava-se  diariamente  um  árduo  processo  de  entender  e  se  fazer  entender.  Do  lado  dos  povos  indígenas  a  abertura  dialógica  cultural,  mas  do  lado  do  Estado,  o  autoritarismo  racional.  Um  dos  desafios  postos  na  atualidade  mundial  é  entender as  identidades   culturais,  saber  lidar  com  a  diferença,  respeitando  as  cosmovisões  do  outro.  Neste  quesito  os  povos indígenas  têm   muito  a oferecer e ensinar.  Ao  se  propor  entender  o  direito  imposto  e  produzido  para  os povos             indígenas        e  como  manejá-los,  mesmo  ciente  que  esta  estrutura jurídica   foi  projetada  para  atender  os  interesses do  capital,   estamos  chamando  atenção  para  a  dimensão  indígena  de  se relacionar   com  os  mundos  e  eleger  projetos  políticos  no  único  intuito  de  continuar  existindo  enquanto  povo  diferenciado  e  capaz  de transitar   entre  diversos sistemas.  Portanto,  este esforço   reflexivo  individual  de  um  advogado  demonstra  de  igual  modo  um  ganho  coletivo,  baseado  na  insistência em entender e fazer seus símbolos serem entendidos”.

Não é pouco, considerando o acervo corrente de poderosos enunciados que os povos indígenas, por seus advogados, Eloy Amado com grande capacidade de locução, lograram fixar na mentalidade dos principais agentes em fóruns nacionais e internacionais que discutem os direitos constitucionais, fundamentais, convencionais e das gentes. Não obstante o obstáculo do positivismo, mencionado por Antonio Augusto Cançado Trindade, duas vezes presidente da CIDH, para que os enunciados internacionais de direitos humanos seja inseridos nos ordenamentos nacionais; ou, a própria abertura cognitiva dos magistrados, demarcava o ministro Lewandowiski na presidência do STF para assimilarem matérias relativas a direitos humanos ou decisões de cortes internacionais nesse campo, que não aprenderam nas escolas, as primeiras, ou solenemente desconhecem para poder aplicar. Condição para o reconhecimento do direito que nasce na aldeia, a avançada formulação que o próprio Eloy Terena fez por ocasião do Seminário Internacional O Direito como Liberdade: 30 Anos do Projeto O Direito Achado na Rua.

 É  por  isso  que – diz Eloy – que a tese “parte da  análise              situacional  do  desenvolvimento  da  política indigenista,  passando  pela  constitucionalização  dos  direitos  e  defende-se  uma  teoria  do  direito  indigenista.  Na  verdade  todo  esse  esforço  intelectual  é  para  fazer  os  brancos  entenderem  o  que  nossas  lideranças  estão  há muito   tempo  dizendo. Não   se  trata  de privilegiar  os  dogmas   jurídicos  em  detrimento  das  categorias  indígenas,  mas  sim,  de  reduzir  a  dimensão  indígena  a rótulos  do  mundo  ocidental  com  o  único  objetivo  de  estabelecer  diálogo,  se  fazer  entender,  e  quem sabe, ser correspondido”. Nem se render, eu acrescento, à elegância mistificadora, encantatória, cântico de sereias, dos neo-constitucionalismos e pós-positivismos, a cujo embalo temos assistido adormecer altas reputações da crítica jurídica, para júbilo gratificante do agro-negócio. Vimos isso acontecer agora no debate em curso no STF.

Essa é uma pergunta implícita que poderia ser feita ao Autor da Tese, mas que nos fazemos a nós próprios todos e todas nós. A resposta não será a que ele nos possa oferecer aqui ao cabo da arguição. Mas a que virá, vitoriosa ou não, ao final do julgamento da tese hoje apresentada no STF sobre a precedência do direito originário dos povos ao direito do Estado. A alternatividade abriu possibilidade para a emergência desse direito? E virá também do Tribunal Penal Internacional quando julgue a questão já apresentada, em face de violações de direitos dos povos originários, que caracterizam a atuação do presidente da República por violação de seus direitos pré-estatais, pré-colombianos, pré-cabralinos, numa ação que se caracteriza como crime de lesa humanidade.

José Geraldo de Sousa Junior é Articulista do Estado de Direito, possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal (1973), mestrado em Direito pela Universidade de Brasília (1981) e doutorado em Direito (Direito, Estado e Constituição) pela Faculdade de Direito da UnB (2008). Ex- Reitor da Universidade de Brasília, período 2008-2012, é Membro de Associação Corporativa – Ordem dos Advogados do Brasil, Professor Titular, da Universidade de Brasília, Coordenador do Projeto O Direito Achado na Rua.55

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