Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito.
Eduardo Xavier Lemos. Teoria Crítica dos Direitos Humanos desde América Latina. A teoria e práxis do coletivo O Direito Achado na Rua. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2023, 476 p.
A descrição da obra lançada na página da Editora se apoia em depoimentos de intelectuais, aliás, membros examinadores da Banca de Doutoramento que validou a tese, origem do livro.
Assim, relevo para:
A tese realmente é importante e extremamente oportuna na medida em que ela é defendida no alvor de um novo período no Brasil, que esperamos que seja a recuperação da esperança, pois neste período anterior o direito no Brasil não teve nada que ver com esperança, teve muito que ver com medo, com opressão, com dominação, com exclusão, com arbítrio.
Boaventura de Sousa Santos – Tribunal de Tese (Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, 24 de fevereiro de 2023) (Universidade de Coimbra)
El trabajo propone una ruptura con todo el absolutismo ético y moral y con la ontología de lo dado, donde esta, evidentemente, el rechazo al positivismo, el trabajo hace una crítica a la fundamentación jusnaturalista y a la fundamentación positivista de la mesma manera, efectivamente no quiere ni una ni otra, hace una fundamentación sociohistórica, que muchas veces corrie el riesgo de caer en una tentación jusnaturalista y aquí se evita.
Maria Jose Fariñas-Dulce Tribunal de Tese (Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, 24 de fevereiro de 2023) (Universidad Carlos III de Madrid)
Tive, com esses notáveis acadêmicos, a oportunidade de compartilhar a banca examinadora da qual também fizeram parte Vicente Barragan Robles (Universidade de Sevilha), e meus colegas da Faculdade de Direito Alexandre Bernardino Costa, Lívia Gimenes Dias da Fonseca e Antonio Sergio Escrivão Filho, estes também membros do Grupo de Pesquisa O Direito Achado na Rua (Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPQ). Além disso, pude vivenciar a experiência de cotutela (UnB/Universidade de Sevilha e assim dividir a orientação com o professor David Sánchez Rubio (Universidade de Sevilha),
Anoto que todo o rico debate pode ser diretamente acompanhado pelo registro YouTube no canal de O Direito Achado na Rua (www.odireitoachadonarua.blogspot.com), conforme o link https://www.youtube.com/watch?v=i3q9-rlXZxQ, num registro valioso das quatro horas e meia de apresentação, arguição, defesa e deliberação, ao final, com a aprovação do trabalho.
Enquanto, de minha parte, realizei aqui neste espaço da Coluna Lido para Você, uma recensão da tese (http://estadodedireito.com.br/direitos-humanos-desde-e-para-a-america-latina/), base para compor a apresentação do livro, sem embargo que a composição gráfica tenha omitido a minha autoria, embora a escrita em primeira pessoa me revele e na quarta-capa o trecho destacado seja indicado como extraído da apresentação e esteja devidamente assinado:
Eduardo, com a metodologia lyriana de ler Marx a partir de seus paralogismos, tal como Roberto Lyra Filho em Karl, meu amigo. Diálogos com Marx sobre o Direito, notadamente no trânsito do invisível para o visível, do ausente para o emergente, do informal para o formal, do plural para o oficial, no relativo ao jurídico direito e antidireito, direito burguês e direitos dos trabalhadores, privilégios e direitos iguais, se opera logicamente pela mediação dialética, pois só se conhece efetivamente de modo sentipensante, corazonadamente.
Tudo isso conduzindo, segundo Eduardo a uma visão complexa, dialética e plural dos direitos humanos designados no sentido instituinte desde Lyra Filho, Joaquín Herrera Flores, David Sanchez Rubio, assim como em Antonio Escrivão Filho no debate que comigo propõe sobre o tema que se colocam como síntese da possibilidade humanizadora, não só como expressão conceitual-filosófica, do humanismo dialético que Lyra Filho formula, em sua leitura hegeliano-marxista-sartreana, mas também no processo de luta por reconhecimento de subjetividades coletivas emancipadas tituláveis de direitos, da própria constitutividade material dos sujeitos inscritos nos movimentos que conduzem essas lutas e que realizam politicamente o humano (cf. Hegel, o humano não é um decorrência de sua origem biológica, mas uma experiência na história; não se nasce humano, torna-se humano).
José Geraldo de Sousa Junior (Universidade de Brasília) Apresentação
No Prólogo elaborado para o livro, David Sanches Rúbio salienta as singularidades que distinguem a obra e a sua característica de um estudo em profundidade acerca da fortuna crítica que forma a base teória e política de O Direito Achado na Rua. O trecho a seguir está destacado na página da Editora:
Desde mi punto de vista, en este derrotero y en esta esfera están algunas de las originalidades, entre otras, de las reflexiones que aparecen en el libro, intentando articular necesarios y urgentes puentes de diálogo y profundizar en muchas de las líneas temáticas y experiencias, tanto teóricas como prácticas, del colectivo Direito achado na rua, concibiendo los derechos humanos desde una perspectiva periférica y marginal y vistos desde América Latina, a partir de una perspectiva crítica, intercultural, compleja, relacional, biocentrada, plural y articulada desde las luchas instituyentes de los movimientos sociales.
David Sánchez Rubio (Universidad de Sevilla) Prólogo
Esse, de fato, é um roteiro que já vinha sendo ensaiado por Eduardo Lemos, preocupado em forjar a sua contribuição à teoria crítica dos direitos humanos desde a América Latina, mas fazê-lo também como decorrência do acumulado crítico do campo teórico-político a que se vincula e que alcança, vê-se por suas referências e revisão bibliográfica, nítido adensamento.
Consulte-se, para tanto, em http://estadodedireito.com.br/30425-2/ – (v.6 n. 2 (2022): Revista Direito. UnB |Maio – Agosto, 2022, V. 06, N. 2 Publicado: 2022-08-31. O Direito Achado na Rua. Contribuições para a Teoria Crítica do Direito. Edição completa PDF (https://periodicos.unb.br/index.php/revistadedireitounb/issue/view/2503), um estudo como essa disposição, aludindo a Eduardo, o que está no Prefácio, assinado pelos professores e professoras O prefácio é assinado pelos professores Adriana Andrade Miranda, Adriana Nogueira Vieira Lima, Alexandre Bernardino Costa, Diego Augusto Diehl, Lívia Gimenes Dias da Fonseca e Talita Rampin, há relevo para a influência do humanismo dialético de Lyra Filho sobre as formulações que sustentam o Direito Achado na Rua e um registro para um ensaio de Eduardo Xavier Lemos que de algum modo antecipa seu posicionamento na tese e no livro que a ela se segue.
Dizem os autores e as autoras do Prefácio, nesse ponto:
A formulação do Direito Novo, proposto pela Nair é tratada no artigo “Do Direito Novo e a Nova Escola Jurídica Brasileira (NAIR) ao Direito Achado na Rua: anomia, poder dual, pluralismo jurídico e os direitos humanos”. Nele, Eduardo Xavier Lemos propõe uma ‘revisitação de temas estruturantes para o conceito de humanismo dialético, projeto da NAIR, retomamos os estudos de Roberto Lyra Filho, José Geraldo de Sousa Junior e os trabalhos escritos pelo coletivo’ e analisa a própria formação do movimento. O autor destaca, na proposta de tal escola de pensamento, ‘o combate fervoroso ao direito positivo e a dogmática jurídica que aprisiona o jurista à letra da lei positivada, ensejando o pluralismo jurídico’.
Atento às exigências que a realidade impõe, em especial, aos movimentos populares, José Geraldo de Sousa Junior, num movimento freireano, atendeu os chamados de movimentos sociais, de suas assessorias jurídicas, de construtores do direito e agentes de cidadania, e incorporou seus temas geradores para sulear o desenvolvimento da série. Em um movimento que é, ele próprio, uma inovação metodológica no campo da educação e do ensino jurídico. O acervo construído sob sua coordenação se constituiu como referência em temas nevrálgicos à defesa do direitos dos/as oprimidos/as: teoria crítica do direito, direito do trabalho, direito agrário, direito à saúde, direitos das mulheres, justiça de transição, direito à informação e à comunicação, direito urbanístico, direito à liberdade.
Localiza-se nessa passagem, o conjunto de categorias aplicadas por Eduardo e que o credenciam como contribuição antológica para demarcar o campo. Assim, remeto ao seu O Pluralismo Jurídico na Omissão Estatal. O direito achado no cárcere. Eduardo Xavier Lemos. Porto Alegre: Núria Fabris Editora, 2014 (conferir por igual minha recensão (http://estadodedireito.com.br/21321-2/):
O livro ora editado, sob os auspícios da sensibilidade editorial de Núria Fabris Editora, é originado da dissertação de mestrado defendida pelo autor na Faculdade de Direito, da Universidade de Brasília. Da apresentação original – “O Direito Achado na Rua, Pluralismo Jurídico, Teoria Crítica dos Direitos Humanos e a Luta por Direitos no Presídio Regional de Pelotas”- a obra conserva a estrutura de três capítulos, nos quais se propõe estudar a reivindicação de direitos no sistema prisional a partir das teorias pluralistas do direito e da teoria crítica dos direitos humanos.
Em seu trabalho, o autor percorre com precisão, o roteiro disciplinado sugerido por Roberto Lyra Filho, para orientar as tarefas do pensamento forte mas socialmente engajado: “ater-se ao ângulo prático, no sentido de prática científica e ligação com a prática social, de onde emerge o discurso epistemológico mais enfibrado”. É nessa condição que o trabalho escapa à derrapagem comum em estudos com o arranque que nele se surpreende, para não cair nos erros comuns advertidos pelo grande pensador na face criativa de suas análises criminológicas (Roberto Lyra Filho, Carta Aberta a um Jovem Criminólogo: Teoria, Práxis e Táticas Atuais, Revista de Direito Penal, vol. 28 Forense, Rio de Janeiro, 1980, págs. 5 a 25).
O estudo parte da análise do pluralismo jurídico, perspectiva teórica adotada pelo autor. Dessa forma, seu primeiro capítulo estrutura-se pelas definições das teorias pluralistas do direito, traçando as características gerais da gênese da teoria.
Registros esses que, ao meu ver, trazem proposições não pessimistas, mas sim reflexivas. Pois, não há qualquer outro caminho, em temas tão sensíveis e interpelantes, que não seguir os direitos e garantias fundamentais para todos os cidadãos e cidadãs do Brasil, até que as penas sejam mais justas, que cada vez o Estado recorra a menos presídios, que se adote um tratamento humanitário para pessoas apenadas, e que as prisões provisórias sejam devidas somente para casos extremos e necessários, de que a utilização das penas guarde proporcionalidade ao injusto, que seja posto fim ao subjetivismo judicial (do decisor), das arbitrariedades, dos casuísmos e que se imponha uma política criminal que vise diminuir progressivamente o aprisionamento no país, para que o cárcere apenas venha a atender casos pontuais, possibilitando uma condição digna para as pessoas que estiverem sob tutela e responsabilidade do estado, e assim alcancem a (re) inserção social para todos que venham a se desviar pelo caminho do crime.
Completo por absolutamente pertinente, com o Prólogo de David Sanches Rúbio:
la obra representa una admirable humildad llena de coraje y valentía. Frente a un sistema económico, institucional, simbólico y cultural capitalista, en el que el narcisismo, la arrogancia, la prepotencia, el cinismo, la agresividad, el egoísmo y la competitividad de los ganhadores frente a los perdedores son la norma, Eduardo Lemos apuesta por espacios relacionales y de convivencia donde predomina la horizontalidad, la reciprocidad, la mutualidad, la fraternidad, la ayuda y los reconocimientos mutuos. Si el capitalismo ecocida, globalifágico, globalifóbico, psicópata y sociópata fragmenta, divide y da buenas razones para matar en nombre del mercado y la generación de riqueza, nuestro querido iusfilósofo pelotense con su obra, desde el espíritu de los movimientos sociales anti-capitalistas y hermanados a partir de sociabilidades basadas en lo común y lo pro-común, propone caminos que puedan enfrentar un sistema que desprecia desde su complejo de superioridad y que clasifica la realidad bajo el par o el dualismo superior/inferior que concretiza desde el patriarcado, el racismo, el colonialismo y el desarrollo desigual.
(*) José Geraldo de Sousa Junior é professor titular na Faculdade de Direito e ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB)
José Geraldo de Sousa Junior é graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal – AEUDF, mestre e doutor em Direito pela Universidade de Brasília – UnB. É também jurista, pesquisador de temas relacionados aos direitos humanos e à cidadania, sendo reconhecido como um dos autores do projeto Direito Achado na Rua, grupo de pesquisa com mais de 45 pesquisadores envolvidos.
Professor da UnB desde 1985, ocupou postos importantes dentro e fora da Universidade. Foi chefe de gabinete e procurador jurídico na gestão do professor Cristovam Buarque; dirigiu o Departamento de Política do Ensino Superior no Ministério da Educação; é membro do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, onde acumula três décadas de atuação na defesa dos direitos civis e de mediação de conflitos sociais.
Em 2008, foi escolhido reitor, em eleição realizada com voto paritário de professores, estudantes e funcionários da UnB. É autor de, entre outros, Sociedade Democrática (Universidade de Brasília, 2007), O Direito Achado na Rua. Concepção e Prática 2015 (Lumen Juris, 2015) e Para um Debate Teórico-Conceitual e Político Sobre os Direitos Humanos (Editora D’Plácido, 2016).