Entre as cláusulas a ser questionadas na Justiça, estão as que forçam o governo a pagar o triplo do valor das ações caso decida, no futuro, retomar o controle da empresa
A privatização da Eletrobrás, concretizada em 2022, foi um dos maiores ataques à soberania do país promovidos pelo governo de Jair Bolsonaro. Além de encarecer a conta de luz para os brasileiros, a operação entregou para a iniciativa privada, a preço de banana, a gestão do setor elétrico e dos rios onde estão instaladas usinas hidrelétricas.
Para piorar, o processo incluiu nas regras algumas cláusulas criminosas que buscam claramente dificultar que o Estado brasileiro volte a assumir o controle da empresa no futuro — algo que acabou acontecendo em muitos países que cometeram o erro de privatizar seus setores de energia.
Para se ter ideia do absurdo, ficou estabelecido que, se o governo quiser adquirir de volta as ações da Eletrobrás que Jair Bolsonaro entregou de mão beijada, deverá pagar pelo menos três vezes o valor da maior cotação alcançada nos dois anos anteriores.
É por isso que o presidente Lula anunciou, na terça-feira (7), que a Advocacia-Geral da União (AGU) vai entrar na Justiça contra alguns itens do processo de privatização da empresa.
“Se amanhã o governo tiver interesse de comprar as ações, as ações para o governo valem três vezes mais do que o valor normal para outro candidato. Foi feita uma quase bandidagem para que o governo não volte a adquirir maioria na Eletrobrás”, disse Lula em entrevista a jornalistas da mídia alternativa.
“Isso é uma coisa maquiavélica, que nós não podemos aceitar (…) O que posso dizer é que foi um processo errático. Foi um processo leonino contra os interesses do povo brasileiro. Foi uma privatização lesa-pátria, (…) a começar pelo fato de que governo só tem 10% da participação quando tem 40% das ações”, completou.
O que a AGU vai fazer?
O que Lula anunciou não foi um plano para cancelar a privatização nem a intenção de, neste momento, comprar ações da Eletrobrás para que o governo volte a ter o controle da empresa imediatamente. A prioridade, neste instante, é utilizar o pouco dinheiro disponível para socorrer a população que passa fome e precisa de saúde, educação e emprego.
Assim, a AGU vai, na verdade, questionar algumas cláusulas da venda, como essas que forçam o governo a pagar mais pelas ações se um dia quiser comprá-las de volta. Essa precaução é essencial porque há grande possibilidade de o Brasil ser obrigado a retomar o controle do setor no futuro.
Isso porque o setor elétrico é estratégico e nenhum país se desenvolve sem ter energia barata para oferecer às suas indústrias. E deixar que empresários controlem o preço da energia é praticamente pedir para que ela fique mais cara.
No caso do Brasil, as hidrelétricas tornam o setor ainda mais complexo, pois gerir uma hidrelétrica é ter controle também sobre os recursos hídricos do país. Por isso, nenhum outro país — sejam os Estados Unidos, sejam a China ou a Noruega — jamais privatizou seu conjunto de hidrelétricas.
Na realidade, tal importância do setor elétrico faz com que muitos países que o privatizam se arrependam e voltem a estatizá-lo. Em maio de 2020, o Instituto Transnacional (TNI) identificou 374 casos de cidades ao redor do mundo que reestatizaram suas empresas entre 2000 e 2019. A maior parte desses municípios fica na Alemanha, na Espanha, no Reino Unido e nos Estados Unidos.
Fonte: Partido dos Trabalhadores