por Ana Paula Daltoé Inglêz Barbalho (*) – Jornal Brasil Popular/DF
A maior ação de mulheres da América Latina acontece nos dias 15 e 16 de agosto, onde cerca de 100 mil mulheres do campo, das florestas, das águas e das cidades se reunirão em Brasília para a 7ª Marcha das Margaridas 2023, sob o lema “Pela reconstrução do Brasil e pelo Bem Viver”.
As margaridas marcham dialogando sobre o sentido e a direção da luta, tecida coletivamente, em busca de melhorias para as condições de vida das trabalhadoras do campo e pela concretização de direitos. A capital do país tem a tarefa de receber e acolher essas trabalhadoras, que garantem a segurança alimentar, o crescimento econômico e o desenvolvimento social do nosso país a partir do campo.
A 1ª Marcha das Margaridas aconteceu em agosto do ano de 2000 e reuniu cerca de 20.000 trabalhadoras rurais em Brasília/DF. Desde o ano 2000, com edições em 2003, 2007, 2011, 2015 e 2019, a Marcha revela a grande capacidade de mobilização e organização de mulheres de todo país. Comemorando os 23 anos de ativismo, as margaridas trazem a soberania popular e a participação das mulheres na política e nos espaços de decisões como pontos importantes para o desenvolvimento do país.
A Marcha das Margaridas é coordenada pela Confederação Nacional de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG), suas 27 federações e sindicatos filiados. Em cada uma das unidades da federação, a Marcha é construída ao longo de quatro anos, em parceria com outros coletivos e movimentos feministas e de mulheres trabalhadoras, centrais sindicais e organizações internacionais. é uma ação estratégica conduzida e protagonizada por mulheres trabalhadoras rurais do campo, das florestas e das águas com a finalidade de construir visibilidade pública e conquistar reconhecimento social e político.
A Marcha das Margaridas envolve processos formativos e de debates, ações políticas e de mobilização, de denúncia e reivindicação, enraizadas em cada território e comunidade até chegar às ruas de Brasília.
O nome escolhido para a Marcha é uma homenagem à trabalhadora rural Margarida Maria Alves, assassinada a mando de latifundiários e usineiros do “Grupo da Várzea”, em 12 de agosto de 1983, na cidade de Alagoa Grande, Paraíba, na porta de sua casa, diante do marido e do filho. Margarida era, desde 1973, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande. Sua atuação em defesa dos trabalhadores oprimidos incomodava aos poderosos beneficiados com a estrutura do latifúndio.
Na primeira edição, a Marcha das Margaridas aderiu ao movimento da Marcha Mundial de Mulheres, que mobilizou mulheres no mundo inteiro contra a fome e a violência sexista. Foi a primeira grande marcha das trabalhadoras rurais e também a maior mobilização de mulheres do movimento sindical até aquele momento. O lema da 1ª Marcha, “2000 razões para marchar contra a fome, a pobreza e a violência sexista”, mostrou ser o prenúncio do que seriam as lutas das mulheres do campo no século que se inaugurava.
Desde os anos 2000, a Marcha das Margaridas tornou-se um espaço de reafirmação da Reforma Agrária ampla e massiva e da Agricultura Familiar enquanto pilar para a construção do Desenvolvimento Sustentável solidário e includente. Contribui enormemente para a desconstrução da herança do modelo familiar patriarcal, que concebe a vida pública e a propriedade como sendo exclusiva do masculino e a vida privada e doméstica como própria da mulher. Nesse sentido, é feminista e inclusiva.
Para as mulheres do campo, da floresta e das águas, a Marcha das Margaridas tem sido um caminho coletivo de construção de um projeto de sociedade que propõe um Brasil sem violência, onde a democracia e a soberania popular sejam respeitadas, a partir de relações justas e igualitárias.
O processo de mobilização e de construção da Marcha traz consigo diversos materiais que dão corpo e conteúdo a cada uma de suas edições: cartas políticas destinadas aos candidatos e candidatas que dialoguem com o projeto político que defendem, plataforma política com a pauta de reivindicações organizada por eixos de luta, cadernos de textos para as formações de base, fotos, vídeos, entre outros que podem ser acessados no site www.marchadasmargaridas.org.br.
As margaridas alimentam o sonho possível de construir novas relações sociais pautadas nos valores da ética, solidariedade, reciprocidade, justiça e respeito à natureza. Nesse sentido, o Bem Viver representa sentido do Brasil que se busca reconstruir: estabelecimento de uma relação de não-exploração com a natureza; consolidação do direito de viver em suas terras e territórios; modificação dos moldes de produção e consumo, e proposição de novas formas de produção de alimentos, de modo a fortalecer a soberania e segurança alimentar e nutricional; participação plena na política e nos espaços de decisões; limitação da concentração de riqueza, levando a uma convivência sem desigualdades, sem pobreza, sem fome, sem racismo e sem violência, em que as mulheres do campo, da floresta e das águas tenham autonomia sobre seus corpos-territórios; e, por fim, o cultivo de relações em que o cuidado e os afetos sejam resguardados por todas e todos.
Realizada sempre em agosto, para re-vivificar o mês em que Margarida Alves foi assassinada, a Marcha das Margaridas lembra a luta e a importância de se manter a chama acesa, buscando novas maneiras de organização e de garantir direitos. São milhares de mulheres do campo, da floresta e das águas vindas de todo o Brasil em marcha nas avenidas de Brasília, no Distrito Federal, para que a sede do poder se aproprie da força que vem destas mulheres, que não descansarão até que os direitos de todas as mulheres sejam efetivados. É uma renvação dos sonhos, reafirmação do direitos e concentração de lutas para as mulheres do campo e da cidade.
A mobilização deste ano acontece em um momento muito importante da história, que é de reconstrução e esperança para o povo brasileiro, já que, mesmo sendo mais de 50% da população brasileira, as mulheres ainda são uma pequena minoria nos espaços de direção dos sindicatos, partidos políticos, governos e demais esferas de poder. Isso porque as regras para a disputa do poder são, logicamente, feitas por quem detém o poder, sem nenhuma intenção de democratizá-lo.
“Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres! Margarida Alves segue presente em nossas lutas!”
SERVIÇO:
7ª Marcha das Margaridas
15 e 16 de agosto 2023
Local: Concentração no Pavilhão de Esposições do Parque da Cidade, com Marcha de luta seguindo pela Esplanada dos Ministérios, a partir das 7h da quarta-feira 16/08/2023
(*) Por Ana Paula Daltoé Inglêz Barbalho, vice-presidente da Comissão Justiça e Paz de Brasília, coordenação da 7a Marcha das Margaridas.