Só em unidades de atenção básica, já foram registrados 977 mil diagnósticos até setembro. Prioridade do terceiro mandato, diz Lula, é novamente acabar com a fome
Em apenas quatro anos de descaso do desgoverno Bolsonaro com a segurança alimentar da população, as sequelas se multiplicam. Entre os mais de 33 milhões de brasileiros e brasileiras em situação de fome, pelo menos um milhão são crianças, público que vem apresentando índices cada vez maiores de desnutrição nos estabelecimentos de saúde.
Os dados do Sistema de Informação da Saúde da Atenção Básica (Sisab), do Ministério da Saúde, revelam que este ano já foram registrados 977 mil diagnósticos de desnutrição de menores atendidos apenas na atenção básica, o que exclui atendimentos eletivos com especialistas, rede privada e de emergência. Em agosto, 136 mil pacientes de até 17 anos foram atendidos com quadro de desnutrição. Em 2015, haviam sido 27 mil.
“Hoje (quarta-feira) mesmo, recebi uma criança que estava em outra cidade, e a família voltou para Caruaru há um mês em busca de trabalho. Está com desnutrição importante, e precisamos enviá-la à UPA (Unidade de Pronto Atendimento) para ser hidratada e, depois, darmos a continuidade do tratamento”, conta Viviane Xavier ao jornalista Carlos Madeiro, colunista do UOL.
Médica da Unidade de Saúde da Família (USF) de Alto do Moura, na zona rural de Caruaru (agreste de Pernambuco), Viviane disse nunca ter visto tantas crianças ou adolescentes com problema de desnutrição, em oito anos de atuação no local.
“São crianças que adoecem com mais facilidade do que as outras, pois não têm os nutrientes necessários inclusive para fabricar anticorpos suficientes”, explica ela. “Essa criança mencionada, por exemplo, vai precisar de nutrição especial, que é muito mais cara e precisará ser fornecida pelo SUS, para recuperar o estado nutricional adequado.”
A sanitarista Bernadete Perez diz que as crianças apresentam vários níveis de insegurança alimentar e nutricional. “Fazia muito tempo que a gente não via uma forma grave de desnutrição”, lamentou a também professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). “Isso tem piorado muito, principalmente nas regiões Norte e Nordeste.”
Para Alcides Miranda, professor de saúde coletiva da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), esse problema parecia superado, mas retornou em decorrência da degradação das políticas públicas federais. “Esses números não apareceram pela melhoria dos registros, até porque não houve aumento de cobertura de área da atenção básica. Trata-se mesmo de agravamento da situação socioeconômica”, conclui.
Empobrecimento das famílias e negligência do governo federal
Enquanto as famílias empobrecem, como consequência da desastrosa política econômica do desgoverno Bolsonaro, os recursos destinados à Saúde também foram pauperizados ao longo dos anos. O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2023 prevê para a área de segurança alimentar e nutricional do Ministério da Saúde apenas R$ 25.576.805, contra R$ 66 milhões orçados para 2022.
A penúria ataca todas as políticas públicas criados ao longo dos governos do PT para garantir a segurança alimentar da população. Entre eles, o programa de doação de leite a famílias pobres do Nordeste e Minas Gerais, a construção de cisternas e a compra de alimentos produzidos pela agricultura familiar.
Em 2021, o Brasil registrou a maior taxa de internações de bebês menores de um ano associadas à desnutrição em 14 anos. Foram 113 hospitalizações para cada 100 mil nascidos vivos. No total, 2.979 menores, ou oito bebês por dia, estiveram internados por problemas gerados pela desnutrição em todo o ano passado.
Em 2008, o índice era de 102 hospitalizações para cada 100 mil nascidos vivos. A taxa atingiu seu menor patamar em 2011, com 75 internações. Até 30 de agosto deste ano, já foram hospitalizados 2.115 bebês por desnutrição. A média diária de 2022 supera a do ano passado, com quase nove internações a cada dia.
Os dados são do Observa Infância, uma iniciativa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) com a Unifase. O levantamento também considera as internações causadas por outras deficiências nutricionais e as sequelas deixadas pela desnutrição. Entre as causas apontadas no estudo, estão o aumento dos preços dos alimentos, a diminuição na renda das famílias e o crescimento do emprego informal.
Além disso, enquanto o Programa Bolsa Família determinava que crianças de até sete anos precisavam ir a uma unidade de saúde a cada seis meses para fazer avaliação nutricional, o Auxílio Brasil de Bolsonaro acabou com essa obrigação. Com o fim do monitoramento da situação nutricional das crianças, casos de desnutrição que poderiam ser resolvidos na atenção primária deixam de ser identificados.
Na última quinta-feira (10), em encontro com parlamentares em Brasília, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva chorou ao comentar o retrocesso dos anos Bolsonaro. “Desculpem, mas o fato é que eu jamais esperava que a fome voltasse nesse país… Porque este país é o terceiro produtor de alimentos do mundo, o maior produtor de proteína animal do mundo e pode garantir que cada cidadão possa comer”, afirmou.
Lula reafirmou que a prioridade zero de seu terceiro mandato será, outra vez, “a mesma que eu disse em dezembro de 2002”. “Se, quando eu terminar este mandato, cada brasileiro estiver tomando café, almoçando e jantando, outra vez eu terei cumprido a missão da minha vida”, afirmou, enxugando as lágrimas enquanto recebia aplausos.
A regra de ouro prosseguiu Lula, “é garantir que nenhuma criança vá dormir sem tomar um copo de leite e acorde sem ter um pão com manteiga pra comer todo dia, é o compromisso que esse país maravilhoso tenha o povo voltando a sorrir”, finalizou o presidente mais popular da história.
Da Redação, com informações do UOL